Páginas

16/06/2015

Bonequinha de Luxo (Truman Capote)

Tenho uma mania esquisita a involuntária, às vezes estou pensando com meus botões, minha cabeça lááááááááá [insira qualquer lugar e pensamento nada a ver com coisas produtivas como trabalhar] e, do nada, me vem o nome de algum autor em mente, normalmente alguém cujo trabalho ainda não tive contato. Foi assim que comecei a ler Edgar Allan Poe, Machado de Assis... e agora aconteceu com o Truman Capote. Não me recordo como e quando descobri que "Bonequinha de Luxo" (Breakfast at Tiffany's) era um livro dele, só julguei ser uma boa forma de começar.

O livro é focado na personagem Holly Golightly e sua vida misteriosa e confusa, narrado em primeira pessoa por um personagem que passamos a conhecer por "Fred" (Holly o chama assim, por ele se assemelhar ao irmão dela), que é escritor, vizinho e, posteriormente, amigo de Holly. Não é daqueles livros que tem início meio fim, mas podemos considerar que a história começa quando "Fred" reencontra o dono de um bar que ele costumava frequentar com a moça, dá para entender que já se passaram alguns anos desde que Holly foi embora de Nova York. Contudo, o dono do bar parece ter uma pista do paradeiro 'atual' dela e, a partir dessa conversa, "Fred" começa a resgatar, em sua memória, as lembranças de quando conheceu a moça.

Sem dúvida, o grande Q U Ê do livro é a personagem Holly Golightly. Tal como o narrador, somos meio que tragados pelos trejeitos e convicções dela. Não que você passe a defendê-la ou partilhar dos mesmos ideais que ela, pelo contrário, H. Golightly tem alguns pensamentos nada politicamente corretos (para os dias atuais), porém o mais incrível é que ela não é alguém dissimulada, fingida... ela realmente acredita naquelas coisas e as convicções dela (mesmo que, por vezes, cause certo espanto no leitor) a fazem agir e falar de um jeito tão fluído e genuíno que é perfeitamente possível você se colocar na posição do "Fred", entender como ele a enxerga e parte do encanto que ele sente por ela.

"-Escute, pode por-me na rua, se quiser. É preciso muita cara de pau da minha parte para aparecer assim. Mas aquelas escadas de incêndio estão geladas como tudo. E você parecia tão aconchegado. Tal e qual o meu irmão Fred. Nós costumávamos dormir quatro em uma cama, e ele era o único que me deixava enroscar-me nele nas noites frias. A propósito, importas-te que eu te trate por Fred?"

Naturalmente que o livro não é apenas Holly e "Fred", somos apresentados à outros personagens, cujos nomes eu tive dificuldade em aprender, confesso, não por eles serem difíceis mais... minha atenção durante a leitura era tão voltada para a H. Golightly que as outras pessoas era só.. as outras pessoas. 

"- Tem que se comportar, Rusty. - ela falara com uma voz doce, mas havia uma ameaça de castigo no seu tom de governanta que o fez corar de estranho prazer e gratidão.
- Você não me ama. - queixou-se ele como se estivessem a sós.
- Ninguém gosta de atrevimentos. - Era óbvio que ela dissera o que ele queria ouvir, pois pareceu tranquilizá-lo e excitá-lo ao mesmo tempo"

A personagem teve envolvimento com vários homens (não exatamente no sentido sexual da palavra), fora uma amiga modelo (que mais queria apunhalá-la pelas costas) e as infindáveis queixas de uma vizinha do condomínio, devido às várias ~festas~ de Holly fazia em seu apartamento. E o gato de Holly, aaah o gato! Um gato que não tem nome, é apenas chamado de gato. Um gato que, na visão de moça, viva com ela por ~conveniência~, de modo que ele não era dela e ela não era dele.

[SPOILER] Há um momento, antes de Holly partir de NY, que ela abandona o gato. Esse trecho é de CORTAR O CORAÇÃO.

"Holly saiu do carro com o gato no colo. Embalando-o, coçou-lhe a cabeça e perguntou.
- O que achas? Parece ser o lugar ideal para um tipo como você. (...) - disse ela, deixando-o cair, e quando ele não se mexeu, erguendo ao invés o seu focinho de bandido que a perscrutava com olhos amarelos de pirata. (...) o gato roçou-lhe a perna.
- Eu disse para desparecer! - gritou ela, precipitando-se para dentro do carro, batendo a porta e ordenando ao motorista. - Siga, siga.
(...)
... uma palidez de inválido assomou-lhe ao rosto. O automóvel parara num semáforo, então ela abriu a porta e largou a correr pela rua abaixo.
(...) - Gato, onde é que está? Venha cá, gato. (...) Oh, santo Deus, nós pertencíamos mesmo um ao outro, ele era meu."

A escrita de Truman Capote não é complexa e rebuscada, mas também não é fluida. Bonequinha de Luxo é um livro curto, mas que, ao menos para mim, não deu para ler rápido. A história em si não tem altos e baixo, embora os acontecimentos mais interessantes ocorram no final do livro.

A maioria de vocês já deve conhecer a história através do filme de mesmo nome, estrelado pela imperatriz da beleza e classe Miss Audrey Hepburn. Faz tempo que vi o filme e não me recordo de muita coisa, mas pude reconhecer várias cenas e perceber que o filme tem uma aura bem mais ~romântica~ que o livro não tem.

"Bonequinha de Luxo" não é um livro frenético e intenso, mas vale à pena seja para conhecer o trabalho de Truman Capote, quando para se render aos encantos de Holly. Ela pode parecer confusa e, por vezes, fútil, mas o que ela busca é o que todos nós buscamos: achar seu lugar no mundo e ser feliz.



"Descobri que o que me faz sentir melhor é apanhar um táxi e ir até o Tiffany's, Fico logo mais calma com a serenidade e o ar digno que aquilo tem. Não há nada de realmente terrível que nos possa acontecer ali, com aqueles homens de roupas elegantes, o cheiro fantástico da prata e das carteiras de crocodilo. Se eu encontrasse um lugar da vida real que me fizesse sentir como o Tiffany's, não exitava em comprar uma mobília e dar nome ao gato. (Holly Golightly)"